Análises, resultados e bônus – A leitura do UFC Fight Night 107: Manuwa vs. Anderson

Kauê Macedo analisa os destaques do UFC Fight Night 107
Photo: © Steve Flynn-USA TODAY Sports

The O2 Arena foi, pela sétima vez, a casa do UFC por uma noite. O Ultimate foi até Londres, (pela nona vez), na Inglaterra (pela décima sétima vez), e realizou um evento que começou morno, mas acabou de forma excepcional, principalmente pelo nocaute brutal de Jimi Manuwa, a finalização sensacional de Gunnar Nelson e a despedida de Brad Pickett do MMA.

 



Photo: © Steve Flynn-USA TODAY Sports

Jimi Manuwa, um dos melhores strikers dos meio-pesados na atualidade, comandou um dos mais belos nocautes de 2017 ao mandar Corey Anderson para a vala com o famoso e tradicional one punch knockout ainda no primeiro round.

Esse foi o segundo nocaute consecutivo de Manuwa e o quinto (seja ele técnico ou não) em seis vitórias no UFC. Além de Anderson, Ovince Saint Preux também foi outra vítima memorável das mãos do inglês.

Corey Anderson, que tinha pinta de que poderia ter um futuro interessante no UFC e, quem sabe, ser até um Ryan Bader ou Phil Davis da nova geração, vai cada vez mais dando a entender que dificilmente chegará ao nível da elite da divisão. A inexperiência pediu a conta contra Gian Villante, depois faltou QI de luta contra Maurício Shogun, e agora foi a vez do nível técnico na trocação cobrar o que um top 5 precisa ter.

Deixando as críticas, positivas ou não, para trás, vamos analisar a lutar.

Jimi Manuwa lutou desde o início do combate com a guarda parcialmente baixa, principalmente com a mão esquerda (a da frente na sua base de destro), para facilitar a eficácia de sua defesa de quedas.

Corey Anderson sabia do perigo nas mãos de Manuwa e começou fazendo muito head movement, movimentando a cabeça em direções variadas para atrapalhar a precisão do adversário.

Anderson não queria jogar na curta distância com Manuwa, por isso, fazia muito trabalho de pernas para ficar da média para a longa distância. Para evitar as investidas do inglês, Corey usava muitas fintas e sempre dava a entender que poderia entrar com algum ataque, seja um strike ou uma queda.

Jimi Manuwa ia espelhando a movimentação de Corey Anderson e ocupando a área do octógono pouco a pouco, até ter um bom controle do centro do octógono. Ele buscava sempre deixar a luta da média para a curta distância, espaço onde melhor atua, e a movimentação era imprescindível para que isso funcionasse.

Desde o primeiro round a diferença técnica na trocação ficou evidente. Corey Anderson tinha um volume de golpes maior, mas desperdiçava muito e conectava pouco, enquanto Manuwa trabalhava num volume um pouco menor, mas com precisão e potência perfeita, além de um nível técnico visivelmente superior até para quem não entende nada de trocação.

Anderson teve uma média de uma tentativa de queda por minuto na luta, sendo três quedas em três minutos e cinco segundos de luta. Manuwa teve um percentual impressionante de 100% de quedas defendidas. Digo impressionante não por duvidar da qualidade defensiva de Manuwa, mas pelo forte poder ofensivo que Anderson tem no wrestling. O inglês foi impecável nessa área.

Chegando nos três minutos, Manuwa antecipou uma finta de queda seguida por uppercut de Anderson e contragolpeou com um jab, que entrou limpo, mas sem muita potência. Porém, Anderson ajoelhou após o golpe, de forma que fica difícil dizer se foi um tropeço ou um breve apagão que ele sofreu após o golpe.

Assassino treinado que é, Jimi Manuwa, assim como um tubarão, sentiu o cheiro de sangue e partiu para o abate. O inglês colocou, nesses cinco segundos finais, mais pressão do que em todo o resto da luta.

Encurtando a distância e forçando o norte-americano a recuar e ficar com as costas para a grade, Manuwa fintou dois jabs, calculou tudo o que pode em milésimos de segundos, e entrou com um left hook absurdamente preciso e potente na têmpora de Corey Anderson, que foi a nocaute instantaneamente, ficando de cara plantada no chão do octógono, enquanto Jimi Manuwa saia andando com toda a calma do mundo após mais um dia de trabalho.

Jimi Manuwa se estabelece de vez como um dos cinco melhores lutadores ativos do mundo na divisão (levando em conta a ausência do lendário Jon Jones), mas não tem muitos desafios disponíveis acima dele no momento. Glover Teixeira, número três do ranking, enfrentará Alexander Gustafsson, número 2, enquanto Anthony Johnson, número 1, desafia o campeão Daniel Cormier pelo cinturão mês que vem. Adoraria vê-lo enfrentando Maurício Shogun, que surpreendentemente vem de três vitórias consecutivas e até lembrou o Shogun “das antigas” no final de sua última luta. Vale lembrar que Manuwa e Shogun eram supostos a se enfrentar em novembro de 2014, aqui no Brasil, mas o inglês se machucou e Ovince St. Preux o substituiu.

A situação de Corey Anderson é um pouco mais delicada em alguns aspectos, mas, de qualquer forma, tem muito mais opções viáveis que do Jimi Manuwa. Ele poderia enfrentar alguém não ranqueado para se recuperar, mas duvido que o UFC vá aceitar isso. Muitos lutadores do ranking já estão com lutas marcadas ou vem de vitórias e não faria sentido casar uma luta assim agora, então, uma das poucas opções interessantes que sobra, é uma luta contra o sueco Ilir Latifi, que vem de derrota por um nocaute brutal (assim como Anderson) para Ryan Bader.

 

Foto: reprodução

Gunnar Nelson mostrou toda sua genialidade no último evento do UFC ao dominar Alan Jouban tanto em pé quanto no chão, protagonizando um dos desempenhos mais bonitos da noite, que, inclusive, lhe rendeu o prêmio de performance da noite.

Essa surra em cima de Alan Jouban garantiu a sétima vitória de Gunnar Nelson no UFC e a sexta por finalização. As únicas derrotas que o islandês já sofreu foram para Rick Story, por decisão dividida numa guerra de cinco, e para Demian Maia, o dono do melhor jiu-jitsu aplicado no MMA em toda a história do esporte. Isso mostra que Gunnar é um atleta de alto nível e que, a menos que você seja um dos melhores do planeta, ele vai te dar uma surra.

Gunnar Nelson, como sempre, entrou na luta absurdamente calmo, usando sua tradicional base de carateca, com as pernas mais afastadas e a guarda levemente baixa e mais aberta, sempre calculando seus movimentos e procurando por uma boa brecha para atacar.

Alan Jouban começou tentando colocar pressão, mas tomando cuidado para não ser pego por um contragolpe fatal do islandês, usando sua base do muay thai adaptada ao MMA e tentando trabalhar seu jogo mais agressivo, que às vezes chega a ser patológico, o que nem sempre acaba bem no mundo das lutas.

O jogo de pressão de Alan Jouban durou pouco no primeiro round. No início, ele tentou andar para frente para chegar onde costuma ficar mais a vontade, mas Gunnar Nelson, que apesar de ser um excelente grappler também é um trocador de alto nível, anulou esse jogo ao administrar melhor a área do cage e tomar o controle do centro do octógono, o que costuma ser devastador para um atleta que depende exclusivamente do jogo de pressão para se sobressair num combate.

O estilo de luta de Gunnar Nelson na trocação é muito pouco ortodoxo e acaba sendo muito imprevisível, até lembra um pouco o caratê espetacular de Lyoto Machida que fez história no UFC entre 2007 e 2014. Esse estilo atrapalha muito um lutador que não está acostumado com esse tipo de luta (Chris Weidman, que treina com Stephen Thompson, conseguiu se adaptar ao estilo de Lyoto Machida no UFC 175, em julho de 2014, graças a isso) ou que não é fora de serie (Jon Jones, por exemplo, sofreu no primeiro round contra o Lyoto, mas, gênio que é, conseguiu se sobressair e atuar bem na trocação no restante da luta). Alan Jouban não se encaixava em nenhuma das opções que costuma se adequar a esse estilo, portanto, acabou tendo muita dificuldade em se soltar na luta.

Por Alan Jouban se tratar de um lutador que tem como ponto forte a trocação, Gunnar Nelson, obviamente, veio com a estratégia de levar a luta para o chão e resolver o resto por lá. Uma das formas que Gunnar utilizou para encurtar a distância foi através da trocação, se mostrando imprevisível e confundindo o adversário, até dar um bote com um direto de direita quando Jouban estivesse com as costas para a grade e, ao invés de dar prosseguimento a combinação de golpes, partia imediatamente para o clinch e, consequentemente, para as pernas do adversário, tentando trabalhar double ou single legs, quedas oriundas do judô ou apenas pontuar no jogo de clinch na grade.

 O arsenal ofensivo de quedas de Gunnar Nelson é muito vasto, enquanto o sistema defensivo de Alan Jouban nessa área é apenas decente. Nelson aproveitou essa vantagem técnica para utilizar quedas incomuns que dificultassem ainda mais a defesa de Jouban, e funcionou perfeitamente.

Quando a luta finalmente chegou ao solo, a diferença técnica na luta agarrada aparentou ser ainda maior. Quedando e caindo já na posição de cem quilos/inside control, Gunnar foi perfeito em tudo o que fez, pressionando o tronco na altura dos ombros e colocando o joelho no abdômen do adversário até conseguir a montada, trabalhando, a partir daí, um controle posicional invejável e, pouco a pouco, pontuando com o ground and pound. É assustador pensar que Demian Maia dominou completamente um lutador desse calibre na luta de chão.

O corner de Alan Jouban fez um bom trabalho no intervalo entre o primeiro e o segundo rounds, e o atleta seguiu aquilo a risca logo no início do segundo round. Jouban voltou a colocar pressão, dessa vez sem se preocupar tanto com os contragolpes e tentando sair de um estilo de pressure fighter para entrar num de brawler.

O mais importante para Jouban era manter o controle do centro do octógono, mas novamente, assim como no primeiro round, ele não conseguiu. Gunnar conseguiu, fazendo o mesmo jogo dos primeiros cinco minutos, administrar com maestria toda a área do octógono e voltou a ter controle das ações.

Como um verdadeiro mixed martial artist, Gunnar Nelson fechou o combate de forma espetacular, mostrando a importância de não ser um lutador unidimensional. Na imprevisível base de carateca, Gunnar entrou com um direto de direita que veio do nada, de forma que Jouban só o viu quando explodiu em seu rosto.

Jouban ficou muito atordoado com o golpe e cambaleou até a grande, onde Gunnar Nelson aplicou um chute alto brutal que novamente explodiu no rosto do adversário sem que ele visse. Frio como gelo (e muito mais inteligente do que quando Rodrigo Minotauro enfrentou Frank Mir), viu a oportunidade e laçou o pescoço de Jouban, trazendo seu tronco para baixo e puxando o adversário para a guarda com uma guilhotina linda encaixada. Alan Jouban não mostrou resposta para tamanha técnica, acabou cedendo à montada e teve que bater para não apagar.

Performance monstruosa de Gunnar Nelson. Pura técnica!

Levando em consideração alguns aspectos físicos, é difícil de imaginar Gunnar Nelson sendo membro da elite da divisão, ele é muito menor que muitos lutadores e mais fraco do que a maioria, mas existem boas chances dele se tornar, num futuro não tão distância, o melhor lutador fora do top 5 da categoria. Ele é muito bom tecnicamente, tem uma luta agarrada de altíssimo nível, mas não no nível de Demian Maia, e tem um ótimo jogo de trocação, mas não no nível de Stephen Thompson e Carlos Condit. Portanto, para atingir seu potencial máximo no UFC, ele não pode ficar dando passos maiores do que a própria perna, e por isso ele deve buscar alguém como Neil Magny e Dong Hyun Kim para sua próxima luta.

 

Confira todos os resultados e bônus oficiais do evento:

Jimi Manuwa venceu Corey Anderosn por nocaute aos 3m05s do R1

Gunnar Nelson venceu Alan Jouban por finalização aos 46s do R2

Marlon Vera venceu Brad Pickett por nocaute técnico aos 3m50s do R3

Arnold Allen venceu Makwan Amirkhani por decisão dividida (28-29, 30-27, 30-27)

Joe Duffy venceu Reza Madadi por decisão unânime (30-27, 30-27 e 30-27)

Francimar Bodão venceu Darren Stewart por decisão unânime (29-28, 29-28 e 29-28)

Tim Johnson venceu Daniel Omielanczuk por decisão dividida (28-29, 30-27 e 29-28)

Leon Edwards venceu Vicente Luque por decisão unânime (triplo 29-28)

Marc Diakiese venceu Teemu Packalen por nocaute aos 30s do R1

Brad Scott venceu Scott Askham por decisão dividida (29-28, 28-29 e 29-28)

Lina Lansberg venceu Lucie Pudilova por decisão unânime (29-28, 29-28 e 29-28)

Performance da noite: Jimi Manuwa, Gunnar Nelson, Marlon Vera e Marc Diakiese

 

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Jornalista freelancer. Matérias publicadas em Nocaute na Rede, Correio Paulista, Medium, Shion Magazine, NetFighter e Pitaco Esportivo. contato: [email protected]
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