NR Entrevista: Frederico Lapenda! O executivo brasileiro pioneiro na globalização do MMA

Nem só de grandes lutadores é feita a história do MMA. Frederico Lapenda é a prova disso.  No embalo dos 17 anos do WVC 3, conversamos com a pessoa...

1616654_637786819619246_282779901_nNem só de grandes lutadores é feita a história do MMA. Frederico Lapenda é a prova disso.  No embalo dos 17 anos do WVC 3, conversamos com a pessoa que deu vida ao evento.  Destaque de revistas internacionais como “Grappling Magazine” e “Gladiators”, Lapenda é considerado um pioneiro e visionário nesse esporte.  

Formado em Cinema na UCLA, (escola renomada que formou nomes como Coppola, diretor da trilogia de “O Poderoso Chefão”), Lapenda, logo cedo se aproximou do mundo das artes marciais. Esteve presente no primeiro UFC em 1993, e em 94, com 24 anos já estava coproduzindo eventos no Japão. Um ano depois, acreditando que o futuro do Vale-Tudo seria de lutadores completos, introduziu ao mundo das lutas o primeiro lutador de MMA, Marco Ruas.  



Com apenas 26 anos, Lapenda criava sua própria organização de lutas, o World Vale-Tudo Championship (WVC). Evento que seria um marco na história do MMA nacional por trazer os maiores nomes da época para lutar no país, além de ter sido o responsável por introduzir o Pay-Per-View no Brasil. Seu evento revelou para o mundo, nomes como: Mark Kerr, Vovchanchyn, Heath Herring, Pedro Rizzo, Pelé Landy, entre outras feras.

Confira abaixo o bate-papo com Frederico Lapenda:

Você foi muito jovem para os EUA tendo como objetivo trabalhar na indústria do cinema.  O que te levou a investir em um esporte que, na época, era bastante marginalizado?

Lapenda: Em primeiro lugar, eu treinei artes marciais e gostava do esporte, e o MMA fazia uma ‘check list’ em várias coisas que eu tinha aprendido na faculdade. O Boxe já foi marginalizado um dia e cresceu.  Eu sabia que era necessário um processo de ‘catequização’. Que era apenas uma questão de tempo para sua aceitação.  Eu não via aquilo como violência, e acreditava que com o tempo outras pessoas também teriam a mesma visão.

Como foi criação do WVC?

Lapenda: A ideia da criação do evento surgiu em 1995. Eu representava o atleta Marco Ruas quando ele lutou no Ultimate Ultimate. Naquele evento as regras do UFC haviam mudado, juízes foram criados, porém as regras não me foram apresentadas.  A luta terminou empatada, mas deram a vitória ao seu adversário, Oleg Taktarov. O resultado me deixou indignado, pois você não pode julgar algo sem explicitar uma constituição antes.   Com isso decidi criar meu próprio evento, para assim não tornar nenhum lutador vítima de falsos julgamentos, e me empenhei para fazer uma revanche entre Oleg Taktarov e Marco Ruas.

A primeira edição do WVC foi realizada no Japão, com um card recheado de nomes conhecidos. Conte-nos como foi este início.

Lapenda: O que eu consegui foi uma coisa inédita. O UFC tinha coroado seis campeões até então, e eu peguei três: Marco Ruas, Steve Jennum e Oleg Taktarov. Era a primeira vez que uma pessoa que não era japonesa promovia um evento de lutas no Japão.  O evento teve a casa cheia. Seis mil pessoas compareceram ao NK Hall em Tóquio.  Eu tinha estudado cinema, isso me ajudou a ter uma visão de entretenimento do evento, já que você filma para transmitir aquilo para outros países, o que gera outra dinâmica, outra engenharia financeira para o evento. Exigiu uma elasticidade de pensamento, uma habilidade de compor com pessoas de outros países e de outras culturas.  O evento teve muito êxito, e serviu como o caminho para criação do Pride FC. Os japoneses pela primeira vez tiveram a oportunidade de assistir os campeões do UFC, e puderam entender como aquele negócio poderia ser lucrativo.

O WVC migraria para o Brasil no evento seguinte, fazendo história por ser um evento a trazer grandes nomes do momento.  Como foi realizar o primeiro evento do WVC em terras nacionais?

Lapenda: O WVC 2 foi revolucionário!  Com as vitórias de Marco Ruas e Oleg Taktarov, no evento anterior, eu pude promover a revanche tão esperada.  Pela primeira vez o Brasil teria uma luta entre dois campeões do UFC, até então, nenhum havia lutado por aqui.   O evento foi realizado em um hotel de alto nível.  O público era elitizado.   Além da Super-Luta, pude lançar Pedro Rizzo, que entrou no torneio de oito lutadores e saiu como campeão.

1598285_637786772952584_1478947828_nHoje faz dezessete anos do WVC 3.  Considera como o evento de maior representatividade que já promoveu?

Lapenda: Se for pegar a história desse esporte, veremos que o WVC 3 marcou uma nova era no MMA.   O UFC 1 marcou a Era dos lutadores de chão.  O submission prevalecia aos strikers.  O que se encerrou no UFC 7 com o surgimento do primeiro lutador completo de MMA (Marco Ruas).  A partir do UFC 9, surgi a Era do ‘Ground And Pound’, técnica dominada pelos wrestlers. WVC 3 teve uma grande representatividade para o esporte porque ali se estabeleceu para os lutadores de jiu-jitsu a importância da divisão de pesos, pois sem a classe de peso, só a técnica não venceria uma luta.    O ponto principal do WVC 3, foi a inauguração do Pay-Per-View no Brasil, e é o Pay-Per-View que é o coração e o sangue do MMA.  O MMA só existe graças a ele, pois é o que o gera o dinheiro e faz a máquina funcionar.  A partir daquele momento, eu introduzi a máquina que ajudaria a dar sustentabilidade e iria alavancar o esporte que eu amo tanto.

A final do torneio do WVC 3 deixaria uma luta épica para os fãs de MMA.  Representantes do Wreslting e do Jiu-jitsu (Kerr vs. Gurgel) se enfrentaram em uma luta que impressionou pela agressividade de Mark Kerr, que se tornaria nos anos seguintes, o lutador a ser batido. O que você achou dessa luta?

Lapenda: Eu tenho uma visão diferente dessa luta.  O mérito maior na minha opinião é de Fábio Gurgel.  O Fábio Gurgel era um lutador de alto nível técnico e de alto nível profissional.   Gurgel estava escalado para enfrentar Jerry Bohlander, em uma revanche, porém, em uma tentativa de sabotar o evento, o UFC contratou Bohlander para lutar e eu fui obrigado a cancelar a revanche do Gurgel.  O brasileiro, no entanto, aceitou participar do torneio mesmo sendo bem mais leve que seus adversários.   Mark Kerr era mais forte, muito mais pesado que o Gurgel, além disso, houve uma grande falha nessa luta.  Existe uma hora que Mark Kerr morde o dedo de Fábio Gurgel, e naquele momento o brasileiro reclama para o árbitro. Mark Kerr se aproveitou disso e deu uma cabeçada no Fábio.  Foi nesse momento que aconteceu o ferimento no rosto do brasileiro. Lembro que o dedo de Gurgel inflamou após a luta. Portanto, teve um pouco da ‘mão de deus’ de Maradona ali.  Na minha opinião o vencedor dessa luta foi o Fábio Gurgel.   Mark Kerr era um excelente wrestler, mas não tinha a mesma eficiência e o conhecimento da arte que o Fabio Gurgel possui.

Com eventos de sucesso, havia uma expectativa de tornar o WVC o maior evento do mundo?  Como se deu o fim da organização?

Lapenda: Eu encarava o UFC por ser o pioneiro, sabia que ele seria o ‘xerox’, e se tornaria praticamente o nome do esporte.  Eles eram a ‘Coca-Cola’ e o WVC por muito tempo foi a ‘Pepsi’. Ter sido o número 2 em receitas por muito tempo foi uma grande vitória para um jovem imigrante.  O problema é que a época era muito difícil, o esporte era muito marginalizado, faltava apoio e eu financiava todos os meus eventos.  O próprio UFC ‘quebrou’ nos EUA.   Eu como fazia eventos fora dos EUA, continuei.  Entretanto, quando você enxerga que está sozinho em uma guerra, a coisa complica.  A partir do momento que você perde a referência, onde maior mercado se fecha, que eram os EUA, fica difícil se manter.  O japonês protegeu o mercado.  Não deixaram eu voltar.  É uma ilha onde eles trabalham entre si. Um sistema de comunidade muito bonito.   Apenas duas coisas davam dinheiro naquele mercado de luta: o Pay-Per-View americano e a bilheteria japonesa.   Com isso, como eu tinha estudado cinema, foquei na produção e direção de filmes, que era um sonho antigo.

Entraste muito cedo nesse ramo.  Com apenas 24 anos, você já era um grande promotor de eventos. Como você avalia aquele momento?  Acredita que com mais experiência faria algo diferente?

Lapenda: Pra mim foi uma dádiva em ter tido a oportunidade de estar no momento certo e na hora certa.  O fato de estar preparado academicamente foi um grande diferencial, por ter a habilidade de encarar aquilo de forma muito mais ampla.

Eu teria feito muita coisa diferente, sem dúvida.  Eu tentei criar o “The Brazilian Dream Team”, que resultaria posteriormente na “Brazilian Top Team”. Sugeri o Carlson (Gracie) para ser o treinador e eu seria o empresário de todos os atletas. Carlson concordou e me tornei o empresário de lutadores como Amaury Bitetti, Vitor Belfort, Mario Sperry, Allan Goes, etc. Quase todos os lutadores do Carlson e da Luta-Livre. Minha ideia era que todo mundo treinasse sob o mesmo teto para se fortificar.  Na época houve uma resistência por parte de dois atletas do Carlson e eu não consegui segurar o racha entre o grupo. Eu tentei aproximar o Jiu-Jitsu da Luta Livre (grandes rivais na época).  Então, eu acredito que eu deveria ter me comunicado melhor, explicado mais essa visão de que, a união entre as artes seriam benéficas para nosso país.

Muita gente o considera um visionário nesse esporte.  Por pensar desde aquela época que um lutador deveria treinar todas as artes marciais e não só ser representante de uma única arte marcial.  O que se reflete no conceito principal hoje no MMA. Como você a evolução do tempo do Vale-Tudo para o MMA?

Lapenda: Olha, pra mim o que houve foi uma quebra de tabu no esporte.  Quando eu tentei criar o “The Brazilian Dream”, na minha visão não existiria mais ‘bandeira única’, o lutador deveria ser completo.  Eu levei Vitor Belfort aos EUA com 16 ou 17 anos.  E vi o quanto ele treinava boxe.  Eu me lembro da luta em que ele nocauteou o Tank (Abbot), e o povo gritava: – Jiu-Jitsu!  Aquilo não fazia sentido nenhum.   Eu previ que o esporte evoluiria nesse ponto.  A minha visão aconteceu no UFC 5, quando Royce empatou com o Ken Shamrock, e diversos lutadores americanos subiram no octógono para abraçar o Ken Shamrock, até os que não eram de sua equipe.  Naquele momento eu entendi que os americanos estavam unidos.  Era necessário que os brasileiros se unissem e passassem a treinar juntos para absorver mais técnicas e assim prolongar o nosso reinado.    

Como você vê o legado deixado pelo WVC?

Lapenda: Eu tenho muito orgulho do WVC por ter sido o único brasileiro a fazer um pay-per-view nos EUA.  Por ter sido um evento que foi televisionado por mais de 100 países. Até hoje me pedem muitos autógrafos, pedem para tirar fotos, recebo diversas cartas de fãs.  Muitos lutadores, inclusive campeões, me agradecem dizendo que foram influenciados pelo WVC.   Eu sou muito feliz sabendo que o WVC teve esse impacto.   Foi uma organização que uniu vários continentes.  Eu produzia outros eventos ao redor do mundo, como Cage Fighting, na Holanda, o Absolute Fighting Championship, na Rússia, que revelou Igor Vovchanchyn.  Fico feliz por ser considerado um pioneiro na globalização do MMA.  A minha ideia era pegar o esporte e espalhar para mundo.  O WVC era essa ponte. Fico feliz em ter revelado para o mundo nomes como Mark Kerr, Pedro Rizzo, Igor Vovchanchyn e Pelé Landy.   Portanto, orgulho é o sentimento que define, por eu ter criado e ter feito parte de um evento tão influente nesse esporte.  

Quais são os projetos atuais no MMA?

Lapenda: Eu ainda sou envolvido com a luta. Fundei uma marca chamada: Fight Game (https://www.fightgame.net/), que atinge vários negócios: marca de roupa, academias de treinamento e videogames.  Já produzi e lancei dois videogames: Fight Game Rivals via XBox Microsoft e Fight Game Heroes via Sony Ericsson.   Também patrocino lutadores com o objetivo de ajudar o crescimento do esporte.  São duas décadas no mundo da luta, de muitos que ainda virão, pois ainda tenho diversos planos pela frente.

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Criado em 14 de agosto de 2013, o Nocaute na Rede tem como principal objetivo FORTALECER o crescimento do esporte pelo Brasil e mundo a fora, é por isso que desde o início divulgamos os pequenos eventos e atletas que estão começando no cenário nacional.
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